JEANE TERRA
PREVIEW
ESCOMBROS
PELES
RESÍDUOS
CURADORIA AGNALDO FARIAS
ESCOMBROS
PELES
RESÍDUOS
CURADORIA AGNALDO FARIAS




Com todas as palavras feitas pra sangrar
Já nos cortamos
Agora já passa da hora
Tá lindo lá fora, larga a minha mão
Solta as unhas do meu coração.
(Chico Buarque. De todas as maneiras)
Passeata é a marcha coletiva organizada como manifestação pública de alegria ou reivindicações, como definem os dicionários. É caminhada, digressão, mobilização. É a ocasião de unir interesses e mostrar propostas. Mostrar as lutas e conquistas, mostrar a cara – pintada ou não. E, mais do que isso, é o local de reimaginar conceitos e perspectivas, conscientizar referências e avaliar ações num processo conjunto sem, contudo, perder as individualidades.
Passeata, exposição da galeria Simone Cadinelli Arte Contemporânea, é um passeio pelas obras de 14 mulheres que, cada uma a seu tempo, procuraram expressar suas angústias e alegrias, suas lutas e questões deixando que a arte fale mais alto. Perceberam que já passou da hora. Que é preciso velar para que ideias não morram, que sonhos não evaporem, que a memória continue viva e seja inspiração sempre.
São diferentes vozes, mas o que ouvimos é o pulsar constante da liberdade conquistada, do direito de levantar bandeiras e mostrar a que vieram.
Longe está o tempo em que o espaço artístico, cultural e social era ocupado exclusivamente por artistas homens. Preconceitos de gênero e ausência de reconhecimento mantiveram as mulheres fora do cenário artístico por séculos e estimularam um olhar diferenciado para suas obras. Foram constantemente julgadas, não a partir de valores estéticos determinados pelo campo artístico, mas sim pelas expectativas sociais ditadas pelas demandas de seu gênero.
A “arte feminina” impôs-se como uma modalidade classificatória perigosa na medida em que a desestabilizava e afastava dos debates estéticos centrais. Não é o fator gênero que define os atributos artístico-estéticos das obras, mas sim o potencial criativo de quem as executa. Trata-se de finalmente dar a elas a palavra, por meio de um gesto ambíguo no qual a diferenciação pelo gênero existe apenas para abrir-se para a universalidade, a mistura e a excelência.
As artistas reunidas em Passeata falam de cores e dores, de certezas e correntezas, de florestas e mares, de letras, rostos, casulos e de delícias e prazeres. São poéticas diferentes que as tornam únicas e, por isso mesmo, tão fascinantes. Cada uma é protagonista e usa sua própria linguagem artística com domínio e expressividade.
Isabel Sanson Portella
Curadora
